Só falta o governo
No Programa de Aceleração do Crescimento, o PAC, as obras que dependem das empresas andam em ritmo bem mais rápido que a parte oficial
No Programa de Aceleração do Crescimento, o PAC, as obras que dependem das empresas andam em ritmo bem mais rápido que a parte oficial
Lula em lançamento do PAC:
muita festa, pouca obra
Recentemente, o governo federal divulgou mais um balanço otimista do Programa de Aceleração do Crescimento, o PAC. Segundo a análise oficial, o andamento de nada menos que 88% das obras encontra-se em estado “satisfatório” — ou seja, quase a totalidade do gigantesco programa de 506 bilhões de reais de projetos de infra-estrutura estaria sendo feita no ritmo ideal. É difícil definir o significado exato da palavra satisfatório no vocabulário do governo — mas ele parece ser diferente daquele normalmente utilizado pela maioria das pessoas. Um levantamento feito pelo partido Democratas com exclusividade para EXAME revela que apenas 10% dos recursos do PAC reservados pelo governo federal para repasses a estados e municípios — a maioria para projetos de saneamento e habitação — haviam sido pagos até o início de agosto. O pagamento de serviços contratados é um indicador utilizado para avaliar o ritmo de execução do programa. Um relatório mais abrangente, feito pela ONG Contas Abertas, traça panorama semelhante. Um ano e meio após o lançamento oficial do PAC, dos 34,6 bilhões de reais previstos no orçamento da União para o programa, apenas pouco mais de um terço foi pago. Ambos os levantamentos se baseiam em dados do Sistema Integrado de Administração Financeira do próprio governo.
Isso não quer dizer que nada foi feito. Quer dizer, isso sim, que muito pouco do prometido foi entregue à sociedade. “Embora bem mais lentamente do que afirma o discurso oficial, algumas coisas estão andando”, diz Adriano Pires, presidente do Centro Brasileiro de Infra-Estrutura. Da longa lista de projetos de infra-estrutura que compõem o PAC, há hoje um pequeno grupo de obras concluídas. Outras estão sendo construídas em ritmo aceitável. É o caso da hidrelétrica de Estreito, um investimento de 2,3 bilhões de dólares que deverá ser concluído em 2010 com capacidade de 1 000 megawatts. Localizada no estado de Tocantins, a usina dá uma boa idéia daquilo que tem andado com maior velocidade no programa — obras majoritariamente privadas, que já haviam sido projetadas ou tinham começado antes do lançamento do PAC. No caso da hidrelétrica de Estreito, o governo só participa como acionista da Vale, que por sua vez detém uma fatia de 30% do empreendimento, cujos sócios principais são a Suez e a Alcoa. No PAC que efetivamente anda, também constam obras sob responsabilidade de governos estaduais e municipais. É o caso do trecho sul do rodoanel de São Paulo, um projeto de 4 bilhões de reais que tem 65% dos investimentos feitos pelo estado e pela cidade de São Paulo. Irritado, recentemente o governador José Serra disse que a publicidade do governo sobre o PAC não passa de um “trololó”. A estimativa é que essa fase do rodoanel esteja concluída até 2010.
Lançado em janeiro de 2007, o PAC reúne mais de 2 000 projetos de infra-estrutura cujo orçamento soma 506 bilhões de reais. Segundo cálculos da consultoria RC, o governo federal só deverá entrar com 41% das verbas. O restante do investimento caberá a empresas estatais, que bancarão 32% do total, e à iniciativa privada, a estados e a municípios, que deverão bancar os demais 27%. Na lista, há um pouco de tudo — de obras semiprontas, como a ferrovia Norte–Sul, iniciada nos anos 80, a idéias ainda em gestação. Há projetos bem modestos, como pequenas pontes, e grandes obras de infra-estrutura, como as usinas do rio Madeira. As poucas obras concluídas sob responsabilidade do governo federal são de pequeno porte — caso da modernização e ampliação do aeroporto de João Pessoa, iniciada em 2004, ao custo de 1,5 milhão de reais, e entregue há um mês. Existem também casos de obras que se arrastavam há tempos e que foram apenas terminadas sob o selo do PAC — como a duplicação da rodovia BR-060, em Goiás, iniciada em 1988 e retomada no começo do ano passado.
No front das más notícias, um dos destaques é o setor de urbanização e saneamento, no qual o ritmo tem sido de tartaruga. É o que acontece tanto nas favelas cariocas da Rocinha e de Manguinhos quanto em centenas de prefeituras de todo o país. Em razão da burocracia no repasse de verbas, as obras não andam. “O maior problema está nos gargalos criados pelos procedimentos da Caixa Econômica Federal, que deve repassar os recursos, mas não tem engenheiros suficientes para auditar o andamento das obras”, diz Carlos Brizzi, presidente da comissão de obras públicas do Sindicato da Indústria da Construção do Rio. As fraudes são outra praga do PAC. Depois de denúncias comprovadas de desvio de dinheiro em obras de saneamento em sete estados, entre os quais Minas Gerais e Rio de Janeiro, o governo sorteou 50 prefeituras para fazer um pente-fino nos gastos e na execução de serviços contratados. Para não atrasar o cronograma, a Controladoria-Geral da União determinou também que as obras, anteriormente embargadas por fraudes, tenham regime especial de acompanhamento. “Para alcançar o ritmo da propaganda, o governo terá de acelerar muito os projetos sob sua responsabilidade”, diz o economista Gil Castelo Branco, da ONG Contas Abertas.