domingo, 22 de maio de 2011

Legislativo de BH adota esquema de controle de presença que abona 90% das ausências


Por Leonardo Augusto , EM.COM.BR:

Quantas vezes o chefe já aliviou aqueles dias em que você não compareceu ao trabalho? E, se aconteceu, qual a argumentação usada com o patrão para não ter o dia cortado? Teve estresse? Na Câmara Municipal de Belo Horizonte não ir ao serviço é uma prática que raramente significa redução no contracheque. Esquema adotado pela Mesa Diretora da Casa prevê que, ao faltar às sessões, os vereadores apresentem uma justificativa afirmando apenas que a ausência ocorreu ou por encontros com a comunidade que representam ou por participação em audiências com a prefeitura, estado ou governo federal. É o suficiente para evitar cortes no salário. Mas não é só o excesso de ausências que chama atenção no Legislativo da capital mineira. Mesmo presentes, os vereadores, em grande parte das vezes, gastam seu tempo em um trabalho pouco produtivo, como apresentação de projetos sem sentido, a maioria de utilidade pública ou para dar nome a ruas, e distantes dos interesses coletivos.

Leiam também o que escrevi sobre a Câmara ainda em 2009: Câmara Municipal de Belo Horizonte e o sinal dos tempos políticos brasileiros

As normas para justificar as ausências estão previstas no regimento da Câmara, no entanto, não há qualquer fiscalização para comprovar a veracidade das informações fornecidas pelos parlamentares, conforme afirma o secretário-geral da Mesa, Cabo Júlio (PMDB). O vereador é responsável pelo recebimento das justificativas das ausências e por decidir se os dias serão ou não abonados. “É desnecessário mostrar provas. Se houver qualquer irregularidade, o próprio colega no bairro denuncia, e aí é quebra de decoro”, diz o parlamentar, apostando em um suposto “dedo de seta” entre vereadores que disputam uma base eleitoral para denunciar irregularidades.

Para escurecer ainda mais o que pode ser chamado de caixa-preta das ausências justificadas da Câmara, o eleitor não tem acesso à documentação usada pelos vereadores para explicar a falta ao trabalho e que serve, ao mesmo tempo, para a manutenção dos vencimentos. Com tanta moleza, o campeão das ausências, o vereador Moamed Rachid (PDT), faltou a 117 (45,3%) das 258 sessões na atual legislatura, entre fevereiro de 2009 e março de 2011. O período entre agosto de 2009 e março deste ano pode ser consultado no site da Casa, liberado para dar transparência ao Poder Legislativo municipal. Os dados dos meses anteriores foram fornecidos pela própria Câmara.

Conforme Cabo Júlio, que assumiu a secretaria-geral no início de 2011, 90% das justificativas apresentadas pelos vereadores são abonadas. O total engloba licenças médicas. Porém, os afastamentos por motivo de saúde são em escala muito menor que as ausências justificadas. Moamed, por exemplo, apresentou apenas um atestado médico. A vice-campeã, Neusinha Santos (PT), com 106 ausências justificadas, deu entrada com nove licenças por motivo de saúde. Moamed não retornou contato feito pela reportagem. Já Neusinha afirma que, por ser integrante do Conselho Nacional das Cidades, vinculado ao Ministério das Cidades, teve que ir a Brasília participar de reuniões.

O próprio Cabo Júlio, líder do PMDB, está em sexto lugar entre os vereadores que mais apresentaram justificativa para as ausências. O parlamentar não compareceu a 75 sessões. “Tenho reuniões com a comunidade e com o poder público. Como líder, vou muito à Secretaria de Governo da prefeitura para discutir projetos e pauta, e minha agenda sempre bate com os dias de sessões”, argumenta.

As reuniões ordinárias e extraordinárias na Câmara de Belo Horizonte são realizadas invariavelmente nos 15 primeiros dias do mês. O presidente da Casa, Léo Burguês (PSDB), que está em sétimo lugar entre os parlamentares que mais apresentaram justificativas para as ausências, 70 no total, não retornou contato feito pela reportagem. Na sexta-feira, ele participava de seminário em Florianópolis (SC).

Cortes chegariam a 4 meses de salários

Conforme o regulamento da Câmara, cada ausência não justificada equivale à perda de 1/30 do salário de vereador, hoje de R$ 9.208. Cada falta, portanto, custaria ao bolso dos parlamentares R$ 306. O campeão das justificativas, o vereador Moamed, perderia R$ 35.802, com suas 117 faltas, valor quase igual a quatro meses de salários.

Entre os ex-vereadores que venceram as eleições de 2010 para deputado, Luís Tibé (PTdoB) é o que mais apresentou justificativas para ausências, 72, entre fevereiro de 2009 e dezembro de 2010. Tibé venceu disputa por vaga na Câmara dos Deputados. No período, foram realizadas 238 sessões ordinárias e extraordinárias. Ele perderia, então, R$ 22.032, o equivalente a mais de dois meses de salários.

Em nota, Tibé afirma que as ausências ocorreram porque estava participando de missão oficial da Câmara nos Estados Unidos – segundo o parlamentar, sem custos para a Casa. Outra justificativa foi que, depois de eleito deputado federal, esteve em Brasília para “para reuniões de bancada e para equacionar algumas questões relacionadas com a posse na Câmara dos Deputados”. A justificativa não está prevista no regimento da Câmara Municipal como passível de abono.

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