terça-feira, 15 de dezembro de 2015

ENTREVISTA MARCIO LACERDA: BH ESTÁ SENDO PREJUDICADA PELA MESQUINHES DO PT

ENTREVISTA

‘BH está sendo prejudicada por algo um tanto mesquinho’, diz Lacerda

Jornal O Tempo entrevista o prefeito de Belo Horizonte, Marcio Lacerda, que fala abertamente do rompimento com o governador Fernando Pimentel

Enviar por e-mail
Imprimir
Aumentar letra
Diminur letra
Fonte Normal
Marcio Lacerda
“Não há esperança de que a arrecadação volte a crescer em 2016.”
PUBLICADO EM 14/12/15 - 04h00
Nesta entrevista, prefeito fala abertamente do rompimento com o governador Fernando Pimentel. Revela que não disputou o governo em função da amizade que tinham e diz que o petista está sendo mesquinho. Durante a conversa com a reportagem de O TEMPO foi interrompido por um telefonema do ministro da Educação, Aloizio Mercadante. Pediu verba para as creches e garantiu que defenderá o apoio do PSB a Dilma, no próximo dia 17.

O senhor anunciou algumas medidas de economia como a revisão de contratos de aluguéis de imóveis. O que ainda fará de ajuste?
OT
Reduzimos em aluguéis, estagiários, no volume de terceirizados, em despesas gerais. Estamos avaliando a possibilidade de redução de cargos comissionados. Está sob análise.
ML
A previsão inicial era economizar R$ 100 milhões. Esse valor foi alcançado?
OT
Só com aluguéis falamos em R$ 25 milhões. Em terceirizados, outros R$ 25 milhões. Outras coisas menores. Será possível alcançar. Pode parecer pequeno em relação ao Orçamento, mas em relação ao risco de déficit é expressivo.
ML
Quantos comissionados seriam cortados?
OT
Para atingir os R$ 100 milhões, provavelmente, precisaremos de alguma coisa, nada muito expressivo. Muitos deles são funcionários de carreira. Nós até estamos fundindo, por exemplo, áreas administrativas de mais de uma secretaria. Se duas secretarias usam a mesma área de apoio, não se extingue formalmente a área, do ponto de vista legal, mas eliminam-se os cargos. Gente perdendo cargo comissionado vai continuar acontecendo.
ML
O senhor terá que fazer mudanças na equipe em função das eleições. Quem deve sair?
OT
O prazo é o fim de março. É algo que não tem tomado o meu tempo. Até agora tivemos uma baixa, o secretário regional do Barreiro pediu exoneração para se candidatar e antecipou a saída. A Luzia (Ferreira) é um caso porque ela deverá sair no fim de março.
ML
"Não acredito que o impeachment vai resolver o problema. Não acredito que passa"
O senhor tinha uma afinidade grande com o Estado, administrado pelo PSDB nos últimos 12 anos. Em janeiro, o governador Fernando Pimentel (PT) tomou posse. Essa mudança alterou a afinação dos projetos?
OT
Certamente mudou. Esperei dois ou três meses para que o governo do Estado tomasse pé da situação, pedi uma reunião com o governador. Levei lá oito ou dez assuntos que deveríamos debater e tomar decisões. O metrô era um deles, e não tive nenhuma resposta. Desde então, não consigo marcar reunião de trabalho com o governador. Eu me encontro com ele, cobro isso, ele diz que vai marcar, e não marca. Tenho recebido notícias de que há certa hostilidade, não digo dele necessariamente. Tem um exemplo concreto que deve estar sendo votado agora na Assembleia, um projeto para descaracterizar uma Área de Proteção Ambiental, a região do Capitão Eduardo, onde começamos em 2010, 2011 um projeto do Minha Casa, Minha Vida para 5.000 apartamentos. Trata-se de uma área de 2 milhões de metros quadrados, usando apenas 500 mil metros quadrados, uma área que fatalmente será invadida, e a notícia que tenho é que a direção política do Estado recomendou a sua base não votar esse projeto. Foi preciso mobilizar a oposição para trancar a pauta para que se fizesse um acordo. Isso não é bom. É Belo Horizonte, a população de baixa renda que está sendo prejudicada por algo que considero um tanto mesquinho em termos de atitude política, não republicana.
ML
Houve certo distanciamento?
OT
Não consigo entender. Na eleição presidencial, fiquei afastado, não participei, apareci no último evento do senador Aécio, apenas como figurante. Aliás, um dos motivos, posso confessar, por não ter sido candidato a governador foi não disputar com meu amigo Fernando Pimentel, que até ajudou a me colocar aqui, na prefeitura. Aliás, não fui eu que rompi com o PT, foi o PT que rompeu comigo.
ML
O que o senhor pensa sobre impeachment?
OT
Pergunto: pra quê? O que o país vai ganhar com isso? Qual o custo que o país vai ter? O que o país precisa? Precisa de um acordo entre essas elites: “Olha, vamos criar um clima de confiança e segurança para que os investimentos voltem e para que diminuam as travas do crescimento”. Não acredito que o impeachment vai resolver o problema. Agora, se a presidente Dilma dissesse: “Vou me desfiliar do PT” e se o PT, num rasgo de generosidade – o que não vai acontecer –, dissesse: “Não vamos disputar a eleição de 2018” –, acho que não precisaria nem dessa segunda. Era só a Dilma falar: “Eu me desfilio do PT, considero mortos todos os acordos partidários existentes que se referem à Presidência da República, vou chamar as grandes cabeças do país, e vamos tentar um acordo para tirar o país do buraco, depois voltamos a brigar lá na frente”. Conversei com o (Ricardo) Berzoini ontem (quarta-feira) num evento no Planalto. Ele disse que propuseram isso para o Lula em 2005, na época do mensalão, ele (Lula) diz que não vai se candidatar na próxima eleição, em 2006, e se desfilia do PT. Ele (Lula) disse: “Vocês vão para o Parlamento tentar o impeachment, e eu vou para as ruas”. Disse ao Berzoini que a situação é diferente. Falei isso para o Aécio e o Anastasia ontem, quem sabe não é um caminho? Não acredito que o impeachment vai passar no Congresso.
ML
"Estamos avaliando a possibilidade de redução de cargos comissionados"
O PT é o grande problema?
OT
Chegamos à situação em que estamos, por parte das nossas elites, mas o PT foi o grande motor para esse buraco em que estamos. Falo isso a eles o tempo todo.
ML
A Câmara tem tido desempenho abaixo do esperado?
OT
Os projetos que estão na Câmara são importantes, e os vereadores são parceiros, protagonistas. Se eles não tocam os projetos, a cidade perde, e eles também, como cidadãos. Nós, de maneira geral, procuramos atender as demandas de obras, de cargos dentro das nossas possibilidades, e de acordo com as habilidades e os currículos que nos são encaminhados, sem criar novos cargos. Penso que a relação da nossa parte é justa. Agora, há um limite, e o limite é esse. Dependemos da Câmara, se ela quiser votar, vota. Se ela não quiser, não vota, mas pedimos: se não gostam, votem contra.
ML
O desempenho está abaixo do que gostaria?
OT
Não gostaria de avaliar isso. É um terreno muito perigoso para esse tipo de análise.
ML
"Não há esperança de que a arrecadação volte a crescer em 2016."
O senhor acha que o atual desempenho tem reflexos da eleição de 2016?
OT
É natural essa angústia pela reeleição. Acho que sim.
ML
O senhor está firme no propósito de fazer um sucessor. O senador Aécio Neves, seu aliado, já pediu que o PSDB e o PSB saiam juntos logo no primeiro turno. Isso será possível?
OT
Acho que sim. Logo depois do Carnaval esse assunto já deve estar mais concretizado, não só as negociações com o PSDB, mas com outros partidos. Precisamos imaginar um projeto político que preserve as conquistas que tivemos aqui nesses sete, oito anos.
ML
Qual perfil de candidato a população quer?
OT
A população quer um bom gestor, de ficha limpa, com experiência comprovada de gestão. As pessoas não estão muito preocupadas se é o do partido A ou B. O importante é que tenha uma boa biografia comprovada.
ML
"A disputa política entre Estado e governo federal prejudicou o metrô."
É visível a mudança de perfil do senhor, que está mais político. Tomou gosto ou a mudança está relacionada a pretensões políticas?
OT
Com 14 anos era presidente de grêmio, fui militante, andei preso um bom tempo. Minha prisão foi uma escola. Como empresário, sempre fui de entidade de classe, andava por Brasília, conversava com ministro, senador. Trabalhar com o Ciro (Gomes) foi uma grande escola, trabalhar com o Aécio (Neves), outra grande escola. É lógico que aqui é o maior aprendizado. No primeiro mandato, fui muito severo em perseguir resultados. Não aceitava convites para viagens internacionais. Fiz uma para Bogotá para ver o BRT. As pessoas entendem política de forma incorreta. Acham que política é atividade político-partidária-eleitoral. Política é você discutir as questões da comunidade, enfrentar contradições, conflitos, vender a sua ideia, adquirir a supremacia com a maioria num projeto.
ML
O senhor se vê mais no rumo da Cidade Administrativa ou do Congresso?
OT
Meu perfil é muito de Executivo, de procurar rapidamente uma alternativa, uma solução. Confesso que para Belo Horizonte faço planos, mas na minha vida pessoal não faço muito.
ML
Prestes a iniciar o último ano, o que o senhor executou que mais o orgulhou?
OT
Obra é visível, o que, normalmente, a população mais valoriza. Avançamos muito na educação, na escola integrada, passando de 15 mil para 66 mil crianças. Construímos ou reformulamos mais 40 centros de saúde, temos o hospital (do Barreiro). O Move/BRT foi um grande avanço, estruturante mesmo. Mas acho que a grande conquista, diria que é a mais frágil, porque depende de fatores políticos, foi o modelo de gestão que implantamos. A verdade é que tivemos uma boa herança. Belo Horizonte teve boas gestões nos últimos 20, 25 ou mais anos. O que conseguimos avançar na gestão foi modernizar para termos mais clareza de metas, indicadores e conseguir que o time inteiro se mobilizasse nesse objetivo. Temos um ambiente de trabalho muito bom. Você não tem disputa político-partidária aqui dentro, tem, mas é muito pequena, porque, como é tudo muito transparente, as desconfianças são logo aclaradas. Como o planejamento e a cobrança do resultado são transparentes, as pessoas procuram dar o melhor de si, e o pessoal mais antigo de carreira se sentiu acolhido. Mandamos 600 deles para a Fundação Dom Cabral para uma reciclagem. Todos maravilhados e agradecidos porque nunca tiveram essa oportunidade. É preciso que a cidade entenda que isso foi um avanço e que a gente não perca isso depois de uma sucessão. Tenho ido a muitos eventos internacionais e visto a comunidade internacional reconhecendo em Belo Horizonte algo diferente. As pessoas, às vezes, não enxergam isso. O peixe na água não está vendo o oceano, mas quem está de fora vê e elogia. Coloquei toda minha experiência de empresário, de gestor público para ajudar nessa transformação.
ML
"Uma coisa que incomoda e em que não deu para avançar é a pichação."
O senhor sai com alguma frustração?
OT
Uma coisa que me incomoda, em que não conseguimos avançar e que, inclusive, se agravou é a pichação, o vandalismo. Não vemos isso nos outros lugares do mundo. O que é triste é que vemos correntes de pensamento ancoradas na universidade, na Defensoria Pública, defendendo isso como um direito à cidade. Não consigo entender essa distorção de pensamento. Quer dizer, entendo, mas lamento muito. Estou dizendo porque vi uma defensora pública falando de pichação; não sei se, caso pichassem a casa dela, ela diria que é direito à cidade. Avançamos um pouco, mas ainda falta a elite – quando falo em elite é no conceito social, intelectual, artístico, empresarial, da comunicação etc. – dizer: “O que concordamos em que podemos atuar juntos para melhorar o futuro?” Conseguimos sentar e conversar, mas não é uma conversa estruturada, como em outros países. As pessoas brigam, disputam na política, na academia, no mercado, mas têm aquele mínimo de consenso. Acho que é cultural. Todos perdem na ausência de entendimento.
ML
Alguma obra?
OT
O pessoal sempre me provoca para falar do metrô. É algo que não estava ao nosso alcance, não foi uma falha da nossa administração. A disputa política entre Estado e governo federal prejudicou, poderia ter avançado mais. Sem o recurso federal não seria possível.
ML
Qual a análise deste ano para a cidade?
OT
Foi o ano de consolidação de várias políticas públicas. O nosso plano de governo de 2013 a 2016 são mais de 500 ações, e devemos chegar ao fim de 2016 com percentual bastante elevado de ações concluídas ou em fase bem adiantada.
ML
Qual foi o impacto da crise nos projetos da prefeitura?
OT
A nossa arrecadação total – própria e as transferências constitucionais e repasses – está praticamente igual à do ano passado. Significa que, com uma inflação de 10%, no mínimo, tivemos uma perda de 10%. O custeio e os salários cresceram até um pouquinho mais dos 10% porque tem reajuste, contratação de pessoal. Fizemos um grande esforço para estancar esse crescimento com medidas de protelação de contratações, de renegociação de contratos. Vamos entrar em 2016 com restos a pagar mais ou menos do mesmo tamanho dos anos anteriores, na faixa de R$ 200 milhões. Janeiro é um mês de muita arrecadação, no ano passado chegou em torno de R$ 1 bilhão por causa do IPTU. Então, conseguiremos liquidar essas dívidas.
ML
Quais as previsões para 2016?
OT
É um ano preocupante em termos de queda de atividade econômica. Não há esperança de que a arrecadação volte a crescer.
ML

Nenhum comentário: